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O choque demográfico

O choque demográfico Publicado em 01-04-2005 Tema: Notícias Passou mais uma campanha eleitoral, chegou mais um governo e mais um novo programa e continua a existir um tema em que a falta de realismo varre tudo, da esquerda à direita: a imigração. Eu sei que é altamente impopular defender a imigração, mas é estranho que nem o pragmatismo da direita (liberal ou nem por isso) e a compaixão da esquerda (moderna ou talvez não) constatem uma evidência. Portugal tem um forte problema demográfico e esse desequilíbrio só se resolve com uma política activa de imigração. Não há nenhuma tendência que demonstre que os portugueses vão começar a ter muitos filhos nos próximos anos e, assim sendo, a "nossa" pirâmide demográfica ficará cada vez mais invertida. Na base da pirâmide há menos gente e no topo há cada vez mais, a viver mais tempo (felizmente) e a precisar de mais comparticipação do Estado, para desespero das Finanças Públicas e, em particular, dos orçamentos da Saúde e da Segurança Social. Tudo isto é evidente e muito se fala na necessidade de se aumentar a idade da reforma, de se pagar menos aos pensionistas e por aí fora. Mas como é que se garante o futuro de um sistema em os contribuintes líquidos são menos e os que recebem o 'payback" vivem por mais tempo? Não consegue. A política de imigração provocou uma das mais graves, embora muito silenciosa, crises do governo anterior. O dossier foi negociado entre Nuno Morais Sarmento e Paulo Portas e, felizmente, ganhou o primeiro. Mas teve que fazer várias cedências. Uma delas foi recuperada, e bem, por este governo: fazer com que todos os filhos de imigrantes que nascem em solo português tenham automaticamente a nossa nacionalidade. É bom mais ainda é pouco. É estranho que o PSD e, sobretudo, o PP gostem muito de citar a Igreja Católica por tudo e por nada mas não ouçam o que o Cardeal Patriarca diz há anos a fio sobre a absoluta falta de humanismo que pauta as nossas políticas de imigração. E é estranho que o PS tenha medo da "classe média" e de algumas forças sindicais que têm medo que os imigrantes lhes venham roubar o emprego. Há uma coisa óbvia. Quando um ucraniano emigra para Portugal não a faz de forma tão natural como um angolano ou um brasileiro, nem o faz pela proximidade geográfica como um marroquino. Um ucraniano atravessa a Europa em condições miseráveis porque sabe que em Portugal há poucos jovens, há muito trabalho pouco qualificado por "ocupar" e há pouca gente a querer fazer esse trabalho. A prova do absurdo que paira sobre esta discussão é simples. Basta anunciar um período extraordinário de legalização de imigrantes para que as ruas à volta do SEF se encham de gente. Ou seja, muitos dos imigrantes de que falo já cá estão, só que não contribuem para a Segurança Social nem para o Fisco, vivem à margem da sociedade, sem quaisquer garantias de saúde ou de educação. Não têm direito a viver com a sua família, numa situação de que qualquer político devia ter vergonha. Podia entrar por questões subjectivas, rácios de produtividade por nacionalidade e afins. São questões que contam pouco mas a que nem os super-gestores do Compromisso Portugal perceberam. Chamaram a atenção para a falta de concorrência que existe no nosso País, mas não viram aquele que é dos nossos piores índices: o demográfico. Se não somos capaz de mudar uma evidência, seremos capazes de alterar alguma coisa importante? Diário Económico (Ricardo Costa)

Publicado: Sábado, 02 Abril, 2005

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