O Parlamento Europeu definiu hoje a sua posição sobre a proposta de directiva relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeito de emprego altamente qualificado, que prevê um "cartão azul UE" ao estilo do "green card" norte-americano. Os deputados clarificam os critérios de admissão e de concessão do cartão azul, mas avisam os Estados-Membros para evitarem a "fuga de cérebros" de países terceiros e respeitarem o princípio da "preferência comunitária".
A UE continua a não ser encarada como um destino aliciante para os trabalhadores altamente qualificados, ocupando uma posição de relativo atraso em relação aos destinos de imigração clássicos, como os Estados Unidos, o Canadá ou a Austrália.
De acordo com a relatora da Comissão das Liberdades Cívicas do PE, a causa fundamental para a fraca atractividade da UE enquanto destino de imigração prende-se com a existência, no espaço comunitário, de 27 sistemas de admissão diferentes, o que dificulta aos potenciais migrantes laborais a livre circulação entre EstadosMembros.
Ewa KLAMT (PPE/DE, DE) saúda por isso a proposta da Comissão Europeia de tornar a UE mais atractiva para trabalhadores de países terceiros com elevado nível de qualificações através de processos de admissão acelerados e flexíveis, incluindo a concessão de condições de residência mais favoráveis.
Na resolução legislativa aprovada em plenário por 388 votos a favor, 56 contra e 124 abstenções, os eurodeputados introduzem numerosas precisões e clarificações à proposta de directiva apresentada pela Comissão Europeia.
Qualificações profissionais
O Parlamento Europeu estende o âmbito de aplicação da directiva aos nacionais de países terceiros com 5 anos de experiência profissional de um nível comparável a diplomas de ensino superior, incluindo, pelo menos, dois anos em funções de direcção, a fim de possibilitar, tanto quanto possível, uma equiparação entre pessoas com e sem formação académica (alteração 14).
A fim de fomentar a permanência na UE dos estudantes que tenham concluído um curso superior no território de um Estado-Membro, os eurodeputados propõem que a directiva seja também aplicável aos nacionais de países terceiros já legalmente residentes nesse Estado-Membro ao abrigo de outros regimes, que requeiram um "cartão azul UE" (alteração 17).
A directiva não se aplicará, no entanto, às pessoas que tenham solicitado o reconhecimento do estatuto de refugiado (e o seu pedido não tenha ainda sido objecto de uma decisão definitiva) nem às que tenham sido admitidas no território de um Estado-Membro como trabalhadores sazonais (alterações 19 e 21).
O nacional de um país terceiro que requeira a admissão deve apresentar um contrato de trabalho válido ou uma oferta de emprego vinculativa de pelo menos um ano no Estado-Membro em causa (artigo 5º).
Remuneração
A remuneração mensal bruta especificada no contrato de trabalho ou na oferta de emprego vinculativa "não deve ser inferior a um nível nacional definido e publicado para este efeito pelos Estados-Membros, que será pelo menos 1,7 vezes a remuneração mensal bruta ou a remuneração média anual no Estado-Membro em causa e não deve ser inferior à remuneração que recebe ou receberia um trabalhador comparável no país de acolhimento", clarifica o PE (alteração 29).
Os eurodeputados salientam que é indispensável aplicar o princípio "para trabalho igual, salário igual", a fim de assegurar o tratamento equitativo de cidadãos nacionais e de países terceiros (alteração 5).
Assistência social e família
Os titulares de um cartão azul UE beneficiam de tratamento igual ao dos nacionais no que diz respeito, por exemplo, à segurança social, à assistência social, ao pagamento dos direitos adquiridos em matéria de pensão no caso de mudança para um país terceiro e aos benefícios fiscais (artigo 15º).
As autorizações de residência para os membros da família devem ser concedidas o mais tardar nos seis meses seguintes à data de apresentação do pedido (artigo 16º).
EstadosMembros "devem dar preferência aos cidadãos da União"
Antes de tomarem uma decisão sobre um pedido de cartão azul UE, os Estados-Membros podem examinar a situação do seu mercado de trabalho e aplicar os procedimentos nacionais e comunitários no que se refere aos requisitos para o preenchimento de vagas. "No contexto do seu poder discricionário, analisam a necessidade de mão-de-obra a nível nacional e regional", clarifica o PE.
O PE refere que é igualmente importante promover dentro da UE a mobilidade de trabalhadores altamente qualificados que são cidadãos comunitários, em especial dos Estados-Membros que aderiram em 2004 e 2007. Na execução da directiva, "deveria ser respeitado o princípio da preferência comunitária" (alteração 4).
Por razões ligadas à política do mercado de trabalho, os EstadosMembros "devem dar preferência aos cidadãos da União e podem dar preferência a nacionais de países terceiros quando previsto pela legislação comunitária", bem como a nacionais de países terceiros que tenham residência legal e recebam subsídio de desemprego no Estado-Membro em causa. O PE acrescenta que os EstadosMembros deverão recusar os pedidos de emissão de cartão azul UE "nos sectores do mercado de trabalho em que o acesso dos trabalhadores de outros EstadosMembros seja circunscrito" (alteração 76).
A relatora clarifica que o cumprimento de todos os critérios de concessão do cartão azul UE não confere qualquer direito aos cidadãos de países terceiros que o solicitem, mas que a decisão de concessão depende da apreciação do Estado-Membro em questão. Deste modo, os EstadosMembros podem ter em conta as necessidades nacionais e regionais em matéria de emprego, dando preferência aos cidadãos da União ou aos cidadãos de países terceiros que se encontram na UE, controlando, assim, a imigração para os respectivos mercados de trabalho.
Evitar a "fuga de cérebros"
O PE avisa que os EstadosMembros "não devem praticar o recrutamento activo" de cidadãos altamente qualificados em sectores em que já se registe ou seja expectável a falta de profissionais no país terceiro isto aplica-se em particular aos sectores da saúde e da educação e que "podem recusar a emissão do cartão azul UE para evitar uma fuga de cérebros" nesses sectores (alterações 9 e 35).
Intervenção de eurodeputados portugueses
Carlos COELHO (PPE/DE): "Sou claramente contra a Europa fortaleza, e por isso apoio políticas activas de admissão de migrantes económicos. A única forma de ter uma política de imigração equilibrada é ser forte no combate à imigração ilegal e regular de forma corajosa a migração legal. É neste quadro que aprovamos a directiva relativa ao cartão azul.
Não queremos limitar, no entanto, a migração apenas às pessoas altamente qualificadas, deixando de fora todos os outros trabalhadores migrantes com menos qualificações. No decurso dos próximos anos, ambas as categorias são essenciais para o desenvolvimento económico e social da Europa. E estamos a falar de muitos milhões de pessoas.
Por essa razão, apoio igualmente a proposta de directiva que visa instituir um procedimento único de concessão de uma autorização única de residência e de trabalho. Para além de trazer vantagens claras em termos de simplificação, redução da burocracia e facilitação de controlo do seu estatuto, permite que se crie um quadro único e transversal de direitos que deverão ser reconhecidos aos trabalhadores migrantes, legalmente residentes no território da União. Apenas com a excepção dos trabalhadores sazonais e dos altamente qualificados, que terão directivas sectoriais, todos poderão desfrutar de um conjunto de direitos laborais equiparados aos usufruídos pelos nacionais do Estado-Membro de acolhimento.
Este tratamento igualitário, em todo o espaço comunitário, deverá permitir combater eventuais situações de exploração de mão-de-obra e melhorar a integração desses trabalhadores, contribuindo para uma maior coesão social.
Concordo com aquilo que Ewa KLAMT sublinha: é útil criar uma via comum de admissão de trabalhadores altamente qualificados, em vez de existirem 27 sistemas diferentes. Concordo com as propostas que a relatora KLAMT fez no sentido de se reforçar o grau de exigência das condições de admissão, ao mesmo tempo que se deve reforçar a prevenção da fuga de cérebros.
Aplaudindo os esforços de KLAMT e de GAUBERT, gostaria de terminar dizendo que lamento que, uma vez mais, pareça que a opinião deste Parlamento não é muito decisiva. Tudo indica que já há uma decisão política tomada no Conselho, que não esperou pelo voto no Parlamento Europeu, e isso lamento".
Pedro GUERREIRO (CEUE/EVN), por escrito: "Relativamente ao estabelecimento de condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de emprego altamente qualificado na UE (o denominado cartão azul) e à criação de um procedimento de pedido único de autorização de residência e de trabalho, consideramos, entre outros gravosos aspectos, que tais iniciativas não podem ser descontextualizadas da política de imigração da UE.
Isto é, estas só fazem sentido e só revelam todo o seu alcance se integradas nos restantes pilares desta política, reafirmados no Pacto Europeu sobre Imigração: criminalização dos imigrantes, centros de detenção, directiva de retorno; controlo de fronteiras, criação da FRONTEX; acordos de readmissão, como cláusula dos acordos de cooperação.
O denominado cartão azul, introduzindo discriminações entre os imigrantes, procura dar resposta aos objectivos neoliberais da Estratégia de Lisboa e às necessidades de mão-de-obra na UE (estabelecidas por quotas), reduzindo o imigrante a mão-de-obra, promovendo a depredação dos recursos humanos de países terceiros nomeadamente, dos seus trabalhadores mais qualificados e implementando perigosos sistemas centralizados na UE de armazenamento e recolha de dados sobre os imigrantes.
Isto é, o cartão azul e o seu procedimento único formam um pilar da desumana política de imigração da UE, que criminaliza e expulsa ou explora e descarta os imigrantes".
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Relatório do PE sobre a proposta de directiva relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeito de emprego altamente qualificado
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Proposta de directiva relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de emprego altamente qualificado
Publicado: Quinta, 20 Novembro, 2008
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