Nome: Alfredo Cruz Fortes
Idade: 67 anos
Nasceu: Cabo Verde – Ilha do Sal
“Quando cheguei, os faialenses até fizeram uma reunião com o intuito de nos expulsar da ilha. Hoje tudo é diferente”
Por que escolheu a ilha do Faial para viver? Eu escolhi a ilha do Faial por causalidade. Eu trabalhava no aeroporto do Sal e na altura, Cabo Verde estava a lutar para ter a sua independência. Por essa razão, a NAV (empresa onde trabalhava), facultou trabalho aos seus funcionários nos aeroportos de Portugal. Eu ponderei, vi a situação daquela época e decidi aceitar a oportunidade no aeroporto dos Açores.
Antes de vir para cá tinha alguma noção do que era o arquipélago? Eu não conhecia os Açores, apenas sabia que também era um arquipélago, daquilo que tinha aprendido ligeiramente na escola. Aquela noção que tinha não era suficiente para vir viver para cá.
E qual foi a sua primeira reacção quando chegou? Eu quando cheguei ao Faial gostei da ilha. Há diferenças entre os Açores e Cabo Verde e uma delas que notei quando cheguei foi a chuva e o verde que revestia esta ilha. À primeira vista vi que esta era a minha terra, aquela onde eu e a minha mulher podíamos fazer a nossa vida.
No início quais foram as suas principais dificuldades? As primeiras dificuldades de adaptação são sempre as de um imigrante, que sai do seu espaço, do seu meio e que deixa a família. Neste aspecto, fomo-nos adaptando com o passar do tempo. No entanto, há sempre dificuldades que nos marcam mais. Na altura, os açorianos não estavam habituados com a imigração e, sobretudo aqueles que estiveram na guerra, tinham uma má noção de África e dos africanos. Eu, a minha mulher e um outro casal fomos dos primeiros imigrantes cabo-verdianos a chegar ao Faial. Lembro-me que até havia pessoas que tinham medo de nós. Se estávamos a andar num passeio elas mudavam-se para o outro. Por outro lado, também havia casos de extrema curiosidade. Se viam-nos na rua, chamavam-se uns aos outros só para nos ver passar. Era uma situação assustadora. E pior do que isso foi no início da nossa chegada. Os faialenses fizeram uma reunião com o intuito de nos expulsar da ilha. Porém, um padre reuniu-os na igreja, pediu-lhes que tivessem mais compreensão e que nos dessem oportunidade, dando o exemplo dos muitos açorianos que tinham saído do Faial há procura de melhores condições de vida. Com o tempo tudo se passou, fiz por marcar o meu espaço e ainda estou aqui.
Falando um pouco no seu país como está a sua relação com Cabo Verde? A minha relação com Cabo Verde é neste momento uma boa ligação. Porém, estive quase 20 anos sem contacto com a minha terra natal. De Cabo Verde vim com o objectivo de vir trabalhar e de cuidar dos meus filhos. Eu vim com uma filha para cá, mas depois nasceram mais três e as coisas mudaram. Sendo que se tornou difícil o regresso à minha terra. Quando saí da ilha do Sal, saí com o pensamento de que só voltaria quando surgisse a oportunidade. Na realidade, foi o que aconteceu. Passados 20 anos voltei à minha terra, gostei muito e tenho ido sempre. A última vez foi há 2 anos, fiquei lá dois meses, passeie por todas aquelas ilhas e deu para matar as saudades.
Mas pensa no regresso? Definitivo não. Só vou lá de passeio e quando posso. É aqui que tenho os meus filhos. Eles não cresceram lá e não têm vínculo nenhum daquele modo de vida. Eu saí da minha terra, perdi os meus hábitos e costumes. Mas aqui nunca me adaptei, vou fazendo para viver e adaptar-me. O que eu passei para chegar até aqui é bom, mas não me diz respeito. A vida de um emigrante é assim perde-se e fica sem rumo.
Então em termos pessoais considera o Faial como sendo a sua terra? Sim, em termos pessoais a minha vida é aqui mas enquanto os meus filhos também estão, porque se amanhã eles mudarem-se para outro sítio eu e a minha mulher iremos atrás deles. Estou aqui porque eles também estão.
Para terminar que balanço faz deste percurso migratório? O balanço que faço deste percurso é positivo. Criei, eduquei os meus filhos e estão todos muito bem colocados. Eu tive sorte mas, a sorte como costumo dizer é própria. Nós mesmos traçamos a nossa sorte.
Rumos Cruzados, 28 de Julho de 2011.
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