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O Presidente da AIPA, em entrevista no Jornal

Açores devem ser ousados na integração de imigrantesPaulo Mendes, presidente da Associação de Imigrantes nos Açores. Foi importante na medida em que permitiu um olhar de cariz mais científico sobre a comunidade cabo-verdiana nos Açores. Até porque sendo uma das comunidades mais antigas fez, na minha opinião, todo o sentido ficar a conhecer melhor esta comunidade. No fundo, o objectivo foi esse: dar a conhecer melhor o impacto dos cabo-verdianos nos Açores, bem como toda a dinâmica desta comunidade aqui no Arquipélago. Para além de que Cabo-Verde e Açores têm uma cumplicidade muito intensa e uma vivência que tem muitos pontos em comum e, por isso, este livro acaba por ter muito significado para mim. Até porque é uma das comunidades mais antigas aqui na Região. Esta obra pretende também ser uma ajuda na elaboração de ferramentas de integração mais adequadas face àquilo que são as aspirações e as expectativas, em especial, da comunidade cabo-verdiana aqui nos Açores. Segundo sei, esta obra resultou de um estudo que teve oportunidade de realizar no âmbito da sua licenciatura em Sociologia, a qual concluiu na Universidade dos Açores. Sim e este livro, espero, acabará por ser uma semente ou um ponto de partida para que outros estudos possam ser feitos acerca das comunidades de imigrantes presentes aqui na Região. E neste estudo que teve oportunidade de realizar conseguiu descortinar as razões que levam, actualmente, os cabo-verdianos a emigrar para os Açores? A comunidade cabo-verdiana, especialmente aqui nos Açores, é sobretudo movida por razões laborais. Enquanto fluxo migratório, o qual teve início na década de setenta, é possível verificar que existiam muitos trabalhadores na área das pescas. Estes, curiosamente, encontravam-se em Sesimbra e acabaram por vir para o Arquipélago. Este foi um primeiro período. Falando num segundo período, a construção civil é o outro sector que acabou por absorver grande parte dos imigrantes cabo-verdianos. Assim, e para responder à sua pergunta, é uma imigração essencialmente laboral. Contudo, há sempre uma percentagem mínima de pessoas que vieram com o intuito de concluir a sua formação, seja universitária, seja profissional. E, finalmente, temos sempre pessoas que acabam por vir exercer a sua actividade profissional em cargos de maior relevância, ou seja, actividades que exigem qualificações mais elevadas. Digamos que estamos a falar de uma comunidade que tem essas várias flutuações. Concluindo, é uma comunidade essencialmente movida por motivos laborais, com especial incidência no sector da construção civil. Sempre com uma repartição equitativa entre homens e mulheres, sendo que a maior parte da comunidade imigrante é constituída por homens. No seu livro menciona que a Região era composta por cerca de cinco mil estrangeiros e que a comunidade cabo-verdiana nos Açores rondava as mil pessoas. Apesar de durante muito tempo ter sido considerada a comunidade imigrante com maior expressão no Arquipélago, a mesma acabou por ser ultrapassada pelos brasileiros. Como explica este fenómeno? Os dados que tem estão correctos, mas depende da perspectiva com que olha para este facto. O que é que acontece? Normalmente os dados a que as pessoas têm oportunidade de aceder acabam por classificar os imigrantes como estrangeiros, independentemente da sua nacionalidade. Nós, aqui, tratamos os dados num sentido muito mais amplo. Aqueles que detêm a chamada dupla-cidadania ainda são classificados como cabo-verdianos e temos, ainda, em última instância, os descendentes. Se pegarmos nesse princípio e contabilizarmos a comunidade com base nesta definição, a comunidade cabo-verdiana ainda continua a ser, tanto ao nível da Região como do País, uma comunidade com muito peso. Contudo, se formos contabilizar a comunidade no seu sentido restrito, ou seja, só as pessoas que têm o estatuto jurídico de cabo-verdianos, verificamos que, de facto, a mesma foi ultrapassada pela brasileira. Não devido a um abrandamento propriamente dito, mas a um aumento do fluxo migratório por parte de imigrantes oriundos do Brasil. Urge salientar, contudo, que ao contrário de outras comunidades, o fluxo migratório proveniente de Cabo-Verde tem sido sempre mais estável, com uma linha contínua ao longo dos anos. Até porque tem tido um fluxo regular. Exactamente. E, a título de curiosidade, se fizermos uma comparação entre as comunidades cabo-verdianas e outras presentes em Portugal, é uma comunidade muito estável. Enquanto que a brasileira e a de leste têm tido períodos em que se pôde verificar uma oscilação, a cabo-verdiana tem tido um fluxo muito regular, mas tem tido, também, um grande suporte das redes sociais. É da opinião de que ainda há muito para fazer para que estejam reunidas as condições necessárias à integração dos imigrantes? Seguramente que sim, até porque a integração é um processo e algo que não acontece de um dia para o outro. São necessárias políticas e aqui, na Região, poderíamos assumir um papel pioneiro e têm, de facto, sido dados passos importantes nesta matéria. Mas há um patamar a ser atingido e há que continuar a trabalhar para que estes “novos açorianos” possam fazer, verdadeiramente, parte da sociedade açoriana num sentido mais amplo. Seja no acesso ao mercado de trabalho, a questão da educação, da saúde, sendo que a questão política é, na minha opinião, um ponto essencial. Aqui, em especial, a Região poderia dar um passo ousado e servir de referência ao País, permitindo que as pessoas pudessem participar e dar o seu contributo na política. No fundo, são questões que acabariam por fazer com que a integração pudesse, efectivamente, ser uma realidade. Região transparece estabilidade económica No seu livro menciona que os fluxos migratórios se revestem de especial importância, sobretudo numa região como os Açores. Porquê? Os fluxos migratórios, para mim, são como um barómetro, o qual funciona nos dois sentidos, ou seja, tanto para o país de acolhimento, como para o de origem. Isto quer dizer que, ao saírem do seu país, as pessoas estão a revelar que, ali, a economia não está a responder às expectativas. Não há estabilidade económica para que as pessoas possam manter o seu nível de vida, entre outras coisas. Por outro lado, se as pessoas vêm para os Açores à procura de trabalho, é sinal de que a Região se encontra a um nível de desenvolvimento económico que transparece estabilidade e crescimento. No entanto, o mundo encontra-se actualmente numa crise económica sem precedentes. O abrandamento dos fluxos migratórios será, ou já deverá estar a ser, uma consequência resultante desta conjuntura, não é verdade? Sem dúvida que sim, porque o fenómeno migratório é muito sensível ao contexto económico. Depois há sempre muita informalidade nos fluxos migratórios. E se a situação começa a estar complicada, as tais redes acabam por passar a informação de que as coisas não estão fáceis para um projecto migratório, o que acaba por provocar um abrandamento. Fonte Expresso das Nove http://www.expressodasnove.pt/interiores.php?id=3716

Publicado: Quinta, 07 Maio, 2009

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